Penso#1 – Sobre as máscaras de espuma

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Começo sempre pelo queixo, zerando tudo o que encontro ali, inclusive uma mosca inconsistente. Na hora ouço bem perto um Você parece um Judeu quando faz isso. Lembro de comentar que frases como essas e expressões como Judiação ou você está me judiando, são um preconceito há muito identificado, mas esse e outros tipos de deslizes são tão   amalgamados em nossa cultura, que soam apenas como neologismos. E volto para o espelho.

Acerto o bigode que desaparece como uma cortina retrátil em fim de peça, aquele momento em que nos textos lemos Cai o pano. E lembro que no mundo do progresso, o pano raramente cai e que desde a invenção das lâminas de barbear até agora, tudo mudou.  Hoje meu aparelho é elétrico e encontra cada canto do nariz e seus pelos, deixando tudo zerado. Seu nome, BLADE.

Lembro de um filme trash dos anos 90 de mesmo nome, onde um vampiro caça vampiros, tentando combater sua próprias posteridade e ancestralidade, ambas imortais. Rio para mim mesmo, sozinho, da inutilidade deste tipo de missão. Paro, e me toco de quantas vezes fazemos isso com nós mesmos. A Blade em minha mão caça a mim mesmo, eliminando agora todas as costeletas, sem que eu fique parecendo um mexicano. E me toco que testemunho o segundo preconceito étnico do dia. E paro para pensar em espuma.

Cubro todos os ossos do rosto para o arremate final, como nos compêndios de anatomia que ensinam que a reconstituição de D. Pedro I, Múmias e Reis de outros tempos é feita a partir de regras bem claras, sobrepondo músculos e pele que acompanham o formato dos ossos e, mesmo assim, são apenas aproximações.

Deduzo que vivemos em busca de aproximações grosseiras daquilo que fica por baixo de todas as máscaras que usamos, elas mesmas meras aproximações de momentos fugazes de nossa rotina. Rio de mim mesmo, tentando cultivar, ou deixando de deter, a barba como máscara das férias de verão.

E me surpreendo com a nova, imberbe, despida, fluida. Noto que, com alguma benevolência, aparento menos dos que os 46 anos que já tenho mas, ao mesmo tempo, sinto que ela envolve uma cansada experiência que pesa muito mais do que já conquistou ou inspirou.

Com a ajuda da água fria, decido que a única maneira de seguir, é cortando moscas, bigodes, costeletas e todas as arestas, personas e linhas editoriais. Sem mais intermediações, me resguardando na única e última fronteira, a única sempre real, anterior aos ossos da face que, como nos ensinam os compêndios de anatomia, moldam as máscaras que usamos em uma busca inútil por nossa posteridade e ancestralidade; o fluxo da minha consciência.

Libero os últimos vestígios da máscara-barba do último verão e me assumo como o Eu-Plataforma. Desligo os algoritmos que sequer pedi e me concentro apenas na história que preciso registrar, não por trás da máscara do texto, da persona, da linha editorial. Crio a partir de agora uma conexão direta entre o fluxo da minha consciência e os ouvidos da sua.

Decido que, para isso, o podcast só poderia ter um nome: o meu. Mauroamaral.com. Escolho todas as segundas como dia de lançamento. Desligo a torneira, abro a porta, respiro o ar abafado do final da tarde verão. O sol se põe por último. Mas, as segundas serão os primeiros.

Ligo o gravador, aperto o REC, aperta o peito.

E começo a contar sobre o dia em que fazendo a barba voltando de férias na praia, entendi que tudo estava errado.

Sobre o autor

Mauro Amaral

Meu principal foco de atuação é a criação de projetos de conteúdo interessantes, divertidos e leves para marcas, organizações e produtos.

Em função desta opção, transito bem entre jornalismo, publicidade e entretenimento, pesquisando continuamente e filtrando ativamente as tendências do momento para aplicá-las no dia a dia dos meus clientes.

Construo, mantenho e estimulo equipes criativas há 10 anos; com especial predileção por identificar novos talentos e trabalhar potenciais multidisciplinares.

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